AS BRUXAS – SEGUNDO CAPÍTULO – Pão de Canela e Prosa
Pão de Canela e Prosa

AS BRUXAS – SEGUNDO CAPÍTULO

bruxas

Quem chegou primeiro foi Maria do Rosário. Trouxe uma cesta de pão de queijo que estava matando a todos de vontade de comer pelo cheiro maravilhoso que impregnava tudo. Sorriu para a amiga e deixou a cesta na cozinha. Veio para a sala e sentou-se no sofá. As duas não trocaram uma palavra. Fazia parte do ritual da meia noite elas não conversarem antes.

Do mesmo jeito, entraram Maria das Dores, Maria da Conceição, Maria da Paz. Cada uma entrou e depositou na cozinha o que trouxe para o chá da meia noite e se assentou no sofá da sala esperando. Quando deu cinco para meia noite, Maria das Dores se levantou e acendeu as velas. Uma a uma iluminavam o ambiente. Maria do Rosário apagou as luzes da casa e a única iluminação do ambiente eram as velas. Cada uma das mulheres se tomou lugar na posição que sempre ocupou nesses rituais e fecharam os olhos. Todos os olhos fechados, menos o de JP que ao lado, na cozinha, resistindo para não comer nada, olhava atento para entender o que acontecia ali. As bruxas de olhos fechados deram-se as mãos. Uma energia cresceu em torno da mesa, uma luz amarelada tomou conta do lugar e JP, entre assustado e curioso, não conseguia se mexer. Observou o garoto que em torno dele também existia uma luz amarela envolvendo-o todo.

Maria das Dores começou a falar baixo, entoando algum mantra antigo, vindo da tataravó da sua tataravó e talvez de muito antes. Maria da Penha abriu o livro que estava sobre a mesa onde anotava todos os feitiços que elas faziam ali e levantando o mesmo, suplicou aos amigos que não eram vistos por qualquer pessoa que tomassem conta da reunião e lhes dessem forças para fazer todo o ritual daquela noite.

Maria da Paz despejou no caldeirão um óleo bento e o cheiro do perfume de flores espalhou-se pela casa. Ela com o segundo dedo da mão direita, molhado naquele óleo, fez um sinal na testa pedindo proteção da mãe que as assistia. Maria do Rosário imitou-lhe o gesto e foi seguida pelas demais que, ao passar o óleo perfumado na testa, pediam proteção dos espíritos que ali estavam.

Uma a uma as mulheres foram se aquietando e novamente se deram as mãos. Silêncio absoluto e JP, na cozinha, continuava assustado, mas não movia um músculo que fosse para não perder nada daquilo.

Maria da Conceição de repente, deu um grito que ficou entre um grito de loucura ou uma risada e levantou os olhos que, nessa hora nada viam. Ela estava em transe e os olhos estavam completamente acinzentados. As outras velhas levantaram as cabeças e todas estavam com o mesmo olhar. Não havia ali um olho humano, mas um espaço cinza, brilhante que parecia ser cego, mas que tudo via. Elas estavam todas possuídas por entidades que participavam do ritual. Ofereceram os corpos para que bruxas milenares estivessem ali reunidas. Todas estavam rindo como se não se vissem há muito tempo.

– Estamos de volta – disse a mulher no corpo de Maria das Dores. – Hoje estamos muito mais fortes.

– Sim, hoje os astros todos se juntaram para que nós consigamos reunir a força universal e seremos nós que mandaremos no mundo e em todos os humanos.

– Hoje, nosso pai estará conosco daqui a pouco e seremos nós aqui pra sempre. As velhas que nos dão o corpo para que estejamos aqui, não voltarão mais. Estarão presas no espaço espiritual e nós mandaremos no mundo.

– Mas como faremos com as famílias? – perguntou aquela que usava o corpo de Maria da Conceição.

– No início, será tudo normal como sempre foi, mas depois a gente dará um jeito em todos eles e acabaremos com todos – respondeu a bruxa que ocupava o corpo de Maria do Rosário. – Mas não poderemos fraquejar. Não podemos deixar ninguém interferir nos nossos planos.

JP, na cozinha, tremia, mas tomava cuidado para tremer em silêncio para não ser visto ou percebido pelas velhas. Então a sua avó querida queria acabar com a família dela. Ele precisava impedir isso. Não poderia deixar que aquelas mulheres matassem seus parentes e amigos. O que era aquilo, meu Deus? Perguntou-se ele quase aos prantos. Nessa hora nem a broinha de milho, nem o pão de queijo, nada importava. Ele precisava tirar a sua avó daquela mesa e acabar com aquele troço esquisito.

O livro, pensou ele, será que naquele livro teria alguma forma de impedir que elas fizessem alguma maldade? Ele precisava pegar o livro. O que ele poderia fazer?

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Artur Laizo Escritor

Artur Laizo nasceu em 1960, em Conselheiro Lafaiete – MG, vive em Juiz de Fora há quatro décadas, onde também é médico cirurgião e professor. É membro da Academia Juiz-forana de Letras e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete, Sociedade Brasileira de Poetas Aldravistas e presidente da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora - LEIAJF.

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