MORTE NA RUA BRÁS BERNARDINO – 4º CAPÍTULO – Pão de Canela e Prosa
Pão de Canela e Prosa

MORTE NA RUA BRÁS BERNARDINO – 4º CAPÍTULO

Os estudantes do apartamento quinhentos e três chegaram todos juntos. Estavam bem preocupados com o que poderia acontecer na delegacia, mas ao mesmo tempo essa fase dos depoimentos causava certa excitação própria da idade deles.
Mário Riberio Paixão, estudante de fisioterapia da Universidade Presidente Antônio Carlos, campus de Granjas Bethânia, onde também estudavam os outros colegas de moradia, tinha vinte e dois anos, era magro, alto, cabelos e olhos pretos e parecia que nunca houvera feito uma atividade física sequer. Gilberto olhou para o rapaz e viu que ele era fumante e provavelmente estava de ressaca da noite anterior. Era muito tímido e viera de Rio Novo para estudar na cidade. Desde que iniciou os estudos achava que não compensava ir e vir todos os dias, apesar da sua cidade ser bem próxima a Juiz de Fora.
_ Você conhecia a vítima, Mário? – perguntou o tenente.
_ Acho que todo mundo conhecia a Fátima, Tenente – respondeu o rapaz ficando vermelho de vergonha.
_ Como assim? – interessou-se Gilberto.
_ Ela era uma pessoa que gostava de receber amigos… quer dizer… Ela gostava de convidar as pessoas para irem à sua casa –respondeu Mário.
_ E você já foi ao seu apartamento?
_ Sim, senhor – respondeu o tímido rapaz do interior. – Eu fui mais de uma vez, senhor.
_ E fizeram o quê? – perguntou o militar muito interessado.
_ A gente conversou, tomamos um vinho… – começou o rapaz.
_ Tiveram relações sexuais? – perguntou Gilberto.
_ Sim, senhor. Eu gostava dela – respondeu o inquieto estudante.
_ Gostava dela?
_ É! Gostava de ficar com ela – titubeou Mário ao responder.
_ Você a amava? – perguntou Gilberto.
_ Não, Tenente. Eu tenho uma namorada lá na minha terra. Gostava de ficar com a Fátima, só isso.
_ Entendo. Você foi à casa dela ontem?
_ Não, senhor. Eu estava em casa com os meus amigos. Ninguém saiu de casa nenhuma vez – declarou ele convicto.
_ Seus amigos também gostavam de visitar a vítima?
_ Sim, senhor. Menos o Pedro. Ele é gay e tem um namorado – explicou Mário. – Eles estão juntos há muitos anos.
_ Entendi – refletiu Gilberto andando pela sala. – Então de vocês seis, cinco já estiveram com a vítima em outras ocasiões?
_ Sim, senhor – concordou o rapaz.
_ Isso não causava briga entre vocês? – perguntou o tenente sorrindo.
_ Não, senhor. Ninguém falava nada a respeito.
_ Você matou a Fátima, Mário? – perguntou incisivo Gilberto.
_ Não, senhor! Claro que não! Deus me livre de matar alguém – ele começou a chorar. – Deus me livre de matar alguém, Tenente.
_ Tudo bem – disse Gilberto entregando para o jovem um guardanapo de papel para que enxugasse os olhos. – Pode ir. Talvez a gente tenha que conversar um pouco mais.
Um dado novo: Fátima, então, gostava de receber amigos em seu apartamento. Ela gostava dos rapazes. Segundo Mário, todos, exceto Pedro, estiveram no seu apartamento. Isso poderia gerar ciúmes em um deles. Poderia gerar ciúmes em Walter. Quem entre eles poderia ter matado a vítima?
O próximo a entrar foi exatamente Pedro. O rapaz de vinte e três anos de idade era alto, forte, praticante de musculação e estava muito bem vestido. Ao convite do militar, sentou-se à sua frente, mas recusou o café que Gilberto lhe ofereceu.
_ Você conhecia a vítima? – perguntou Gilberto.
_ Sim, senhor – respondeu ele. – Ela era uma pessoa muito legal. Ela gostava de se vestir muito bem e a gente conversava muito sobre moda.
_ Você esteve no apartamento dela alguma vez? – perguntou interessado.
_ Estive sim, senhor. Não posso dizer que éramos amigos, mas ela e eu tínhamos algumas coisas pra conversar principalmente sobre roupas – declarou ele.
_ Você teve relações sexuais com a vítima? – perguntou direto Gilberto.
_ Claro que não, Tenente. Eu sou gay e tenho um namorado fixo há anos – ele riu. – Não gosto de mulher.
_ Tudo bem – aceitou Gilberto. – Você matou Fátima?
_ Deus me livre de matar uma mulher daquelas – disse ele. – Ela era uma mulher muito chique, senhor. Muito educada e muito legal com as pessoas.
_ Seus amigos de república, todos frequentavam o apartamento da vítima – disse ele como quem não tinha certeza, – você ia com frequência também?
_ Eu ia muito lá durante o dia, nos fins de semana, quando não tinha ninguém com ela – explicou ele. – Mas a frequência que eu ia lá… Eu devo ter ido ao apartamento dela duas ou três vezes. Não mais que isso.
Pedro foi liberado e Antônio Carlos e José Luiz tiveram o mesmo depoimento. Eles conheciam a vítima, tiveram em seu apartamento algumas vezes, tiveram relações sexuais com a vítima, mas nenhum deles a amava ou era frequente essas visitas. Ambos afirmaram que não mataram Fátima.
Henrique Ferreira era um homem feito aos vinte e sete anos. Ele tinha olhos e cabelos negros, era magro e não praticava nenhum tipo de esporte. Bebia com regularidade, preferia cachaça, mas sempre tomava cerveja com os amigos. Não se sentia um alcoólatra apesar da frequência com que ingeria bebidas alcoólicas.
_ Você conhecia a vítima, Henrique? – perguntou o tenente.
_ Sim, senhor. Eu estive em seu apartamento algumas vezes – respondeu o rapaz. – Ela era uma pessoa muito só e gostava da companhia de rapazes.
_ E seus amigos pelo jeito também frequentavam o apartamento da vítima?
_ Sim, senhor – ele não titubeou em responder. – Ela conhecia todos nós. Até o Pedro que não gosta de mulher se dava bem com ela.
_ Você matou a Fátima, Henrique? – perguntou súbito Gilberto.
_ Claro que não, Tenente. Que pergunta! Eu não mataria nem um animal, muito menos a Fátima – respondeu ele assustado e firmando o corpo antes relaxado na cadeira.
_ Tudo bem, rapaz. Eu preciso perguntar isso para todo mundo. Com certeza o assassino vai responder que não matou também.
_ Pode ter certeza que lá de casa, ninguém matou. Não saímos de perto daquela mesa de jogo e da cerveja nem um minuto. E em uma quitinete para sair todo mundo percebe. Ninguém saiu desde as vinte e duas horas.
_ Muito bem. Obrigado.
Carlos Ribeiro contou a mesma história dos amigos e não acrescentou nada. Ele também afirmou que nenhum dos seis amigos deixou o apartamento depois das vinte e duas horas.
Gilberto poderia excluir os seis rapazes do rol de suspeitos de matar Fátima? Acabei de descobrir que a vítima, na realidade, era uma mulher bastante sociável. Ela, pelo menos se relacionava sexualmente com seis pessoas até agora. Menos o Pedro que é gay, ele sorriu ao pensar nisso. Mas também ele tinha entrado na casa da vítima algumas vezes. Quem teria interesse em se livrar dessa mulher? Se eles todos se relacionavam com ela, poderiam ter ciúmes. Quem a amava tanto que poderia querer exclusividade? Walter era quem parecia mais interessado nessa situação. Ciúme, amor e sexo, sempre a tríade. Gilberto se levantou de sua mesa, precisava tomar mais café.

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Artur Laizo Escritor

Artur Laizo nasceu em 1960, em Conselheiro Lafaiete – MG, vive em Juiz de Fora há quatro décadas, onde também é médico cirurgião e professor. É membro da Academia Juiz-forana de Letras e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete, Sociedade Brasileira de Poetas Aldravistas e presidente da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora - LEIAJF.

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