O VAMPIRO LEONARDO – Pão de Canela e Prosa
Pão de Canela e Prosa

O VAMPIRO LEONARDO

Cheguei na janela, respirei o ar da noite e pensei brincando: Cadê o meu amigo vampiro? Olhei para as plantas do jardim iluminadas pela lua. Senti o cheiro da noite. Um cheiro bom. Um cheiro doce. Um cheiro de Patchouli.

Patchouli! Um cheiro suave que se tornou mais forte e eu procurei pelo jardim. Nada! Na escuridão além do jardim, nada! O cheiro estava forte e eu busquei novamente e parado na escada de casa estava ele. Um homem forte, musculoso sem exageros, cabelos longos e negros soltos e voando.ao vento me olhando. Os olhos vermelhos e luminosos me encontraram e ele sorriu. A lua cheia lançou um raio de luz para fazer com que suas presas se realçassem. Estava ali o meu vampiro!

Eu fiquei assustado e tentei me esconder. Ele riu e disse com a voz mais máscula e gentil que eu jamais houvera ouvido:

_ O que você quer?

_ O que você quer? – repeti a pergunta austero.

_ Ora bolas, você anda me procurando há dias. O que você quer comigo?- perguntou ele não tão amável mais. – Estou aqui!

_ Tudo bem – concordei com ele. – Vamos conversar.

_ Vamos! Você sai ou eu entro? – olhos vermelhos sorrindo.

_ Nem uma coisa nem outra, meu caro. Se eu saio você me morde e chupa meu sangue. Se eu te convido pra entrar, aí complica de vez. Ou você acha que eu não sei que pra um vampiro entrar em uma casa ele precisa ser convidado?

_ Tudo bem. Você deve saber tudo de vampiros… – ele riu mais uma vez e a lua fez questão de brilhar nas presas longas. – O que faremos então? Você na janela, eu no chão, tá até parecendo Romeu e Julieta. Só que nesse caso ‘tá sendo Romeu com Romeu e isso não é do Shakespeare.

_ Romeu e Romeu, isso parece até novela moderna da Rede Globo – eu ri ficando mais à vontade na presença dele. – O que você anda fazendo?

_ Eu tenho vivido por aí, só a noite, claro. Mas há dias que eu não me alimento.

_.Verdade? Por quê?

_ Cara, com essa mania de fitness, de tudo natural, low carb, não dá vontade de chupar o sangue de ninguém. Antigamente era melhor.

_ Antigamente?

_ Sim – respondeu ele. – Antigamente o povo se alimentava e tinha um sangue forte. Dava gosto um sangue de gente com comida caseira de roça.

_ Hoje o povo não sabe comer…

_ Não. Hoje com essa mania de dieta, tudo é proibido – ele me olhou mais uma vez, – mas você se alimenta bem. Está com cheiro que me agrada de sangue forte.

_ Mas você não pode chupar meu sangue

_Por que não?

_ Porque eu morrerei ou virarei vampiro.

_ Exatamente – concordou ele. – Podemos fazer diferente e eu só me alimento.

_ Claro que não! Se você não parar…

_ Eu preciso de você – ele me olhou com mais intensidade na luz vermelha dos olhos.

_ Precisa de mim? – perguntei curioso. – pra quê?

_ Pra escrever a minha história também – disse ele descendo da escada lateral e me olhando em frente à janela do pátio.

_ E por que eu escreveria a sua história? – ri.

_ Porque não? – respondeu com outra pergunta.

_ Mas eu não conheço você ainda.

_ Por isso estou falando pra você vir aqui fora.

_ De onde você apareceu? Douglas o conhece?

_ Não fale o nome desse cretino – gritou ele.

_ Não grite. Vai chamar a atenção dos vizinhos.

_ Eles não vão me ver e nem escutar – riu ele. – Fica tranquilo.

_ Por que você não gosta do Douglas? – perguntei, querendo saber o que ele tinha contra ao meu amigo vampiro Douglas.

_ Ele não gosta de mim – respondeu ele.

_ Quem é você? – perguntei.

_ Eu sou o Leonardo. Pode me chamar de Léo.

_ Você se parece com Augspartem – observei.

_ E onde anda esse turista? – perguntou.

_ Não sei te dizer. Não fico tomando conta deles o tempo todo. Nem do Douglas tenho tido notícias.

_ Você agora passará a saber de mim – afirmou ele. – Vou ser seu vampiro – ele riu. – Não é isso que você quer? Um outro vampiro seu?

_ Mas o que significará isso?

_ Vamos ter muitos momentos juntos…

_ Vamos? – perguntei.

_ Sim. Você vai me ver muitas vezes.

_ Gosto desse perfume.

_ Eu sei. Seus vampiros todos cheiramos a Patchoili. Você nos fez assim.

_ Pois é – eu ri.

_ E ainda assim tem medo de vir aqui fora conversar comigo?

_ Não – respondi.sem nenhuma segurança.

_ Se sou também uma criação sua, como posso atacar você?

_ O personagem sempre ganha vida própria – falei aquilo que sempre repito nas minhas palestras de literatura.

_ Eu estou chegando…

_ Eu não tenho medo de você – afirmei.

De repente, em um ato de coragem eu abri a porta de casa e saí para o pátio onde cultivo minhas flores. Ele me olhou de longe e sorriu. O.cheiro de Patchouli ficou mais forte e todo pátio estava iluminado de vermelho. Eu estava receoso, jamais estivera frente a frente com um vampiro que não fosse o Douglas e uma única vez com Augspartem. Aquele vampiro parecia mais sinistro e muito menos confiável.

_ Estou aqui – disse-lhe eu.

_ Muito bem. Para um criador de vampiros você é bem corajoso.

_ Sou. Não tenho que ter medo de você.

_ Não?

Em milésimos de segundos ele estava à minha frente e me abraçou. Braços fortes, frios, pareciam pedras. Eu jamais escaparia daquele abraço.

_ Você cheira bem – fungou ele sentindo o cheiro do meu pescoço. – Gosto desse cheiro.

Eu sentia que estava imobilizado naquele abraço do ser das trevas e ao mesmo tempo que queria fugir, o encantamento do Vampiro me impedia de fazer qualquer ato contrário ao que estava acontecendo.

_ Eu quero você – disse ele cravando as presas em meu pescoço.

Eu senti a dor da mordida e um prazer imenso que toda vítima sente ao ter seu sangue sugado por um vampiro. O prazer durou poucos segundos. De repente, eu estava livre do abraço e Léo jogado no chão a cinco metros de distância.

_ Eu também quero – falou ríspido Douglas me segurando para que eu não caísse.

_ Eu estava fazendo o que você não fez – grunhiu o vampiro caído.

_ E não vou fazer ainda – olhou pra mim com os olhos vermelhos e acesos, porém carinhosos e me ordenou: – Entre em casa!

Saí de seu abraço me amparando, ainda com as feridas das presas do Léo sangrando. Ele observou aquilo e aproximou-se do meu pescoço e lambeu as feridas que imediatamente pararam de sangrar e me soltou. Corri pra casa e voltei pra janela pra observar o que fariam.

_ Por que não me deixou beber do sangue dele? – perguntou Léo.

_ Porque ele é importante para nós.

_ Como assim? – perguntou o vampiro mais novo.

_ Ele precisa acabar de escrever a minha história – disse ele rindo. – Depois eu vou ver o que fazer.

Pareceu-me que suas presas brilharam mais à luz da lua. Eu senti um calafrio pensando que tão logo eu termine o livro “O vampiro Douglas” ele vai fazer de mim um vampiro. Será que Augspartem permitiria? Nao sei! Acabei de ver que o personagem ganha vida própria independente do autor. O que me aguardaria nesta vida de vampiros?

Olhei novamente pela janela e somente Douglas estava parado em frente à mim.

_ Tome cuidado – ele sorriu talvez só para mostrar os dentes. – Não poderei protegê-lo sempre.

_ Tudo bem – aceitei sua recomendação. – Obrigado.

_ Como vai meu livro? – perguntou-me ele sabendo que há dias eu não escrevia sobre ele.

_ Precisamos nos encontrar para você me contar mais sobre você.

_ Virei te buscar para um passeio qualquer dia.

Ele riu e sumiu com toda a luz vermelha que cobria todo o espaço aberto do pátio. Eu fechei a janela e fui pra sala com o pescoço latejando nos dois furos das presas do Léo e ao enfiar a mão no bolso encontrei um papel com um bilhete do vampiro que me atacou: Liga pra mim. Logo abaixo vinha o número do seu WhatsApp. Eu ri.

Não sabia onde iria parar isso, afinal eu acabava de adquirir mais um amigo vampiro.

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Artur Laizo Escritor

Artur Laizo nasceu em 1960, em Conselheiro Lafaiete – MG, vive em Juiz de Fora há quatro décadas, onde também é médico cirurgião e professor. É membro da Academia Juiz-forana de Letras e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete, Sociedade Brasileira de Poetas Aldravistas e presidente da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora - LEIAJF.

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