ENSIMESMISMO – Pão de Canela e Prosa
Pão de Canela e Prosa

ENSIMESMISMO

Vivemos em um ensimesmismo terrível.
O que interessa, o que importa é o indivíduo no centro das atenções, ao redor do qual devem girar todas as outras míseras pessoas que o adoram e veneram. O eumesmismo é uma loucura porque não há nada que ninguém faça que seja melhor do que aquilo que eu fiz. Eu sou o astro rei, sou merecedor de todas as atenções do resto dos mortais. Eu sou poderoso, não preciso cumprimentar meu porteiro que me abre a porta todos os dias, não preciso me dignar a olhar na cara da faxineira que faz o meu mundo ficar mais limpo, não preciso respeitar polícia, vigias e outras pessoas que trabalham mantendo a ordem para que meu mundo seja melhor.
Meu trabalho é o melhor. É indispensável! Sem mim o mundo, quiçá a Via Láctea, não existe. Minha obra é a mais valiosa e aquilo que eu faço é sempre uma obra-prima. Tirando o que eu faço, pode ser boa também, alguma coisa que um ídolo fez no século passado, se eu me permitir ter um ídolo. No mimmesmo o ídolo sou eu! Se alguém me mostra uma coisa que fez, mostro outra que eu fiz e que é melhor, é claro. Minha comida é mais gostosa. Meu perfume é mais cheiroso. Minha vida pode ser uma merda, mas é melhor que a de todo mundo.
Eu aprendi que eu tenho que me mostrar e me valorizar ao máximo porque ninguém o fará. Eu não faço, não elogio nada de ninguém. Jamais vou falar bem de alguém, quem quer que seja. Se eu falo bem de alguém, podem pensar que esse alguém é melhor que eu e onde fica o eucentrismo amado. Eu me amo tanto que somente para mim as coisas têm que acontecer. O mundo tem que babar aos meus pés porque eu assim o quero e mereço.
Se o eu perfeito e amado – ama a si mesmo -, olhar para o lado, verá que existem tantas coisas iguais ou melhores que ele. Por isso pratica o euceguismo onde só vê a si mesmo. Eu sou foda! Só eu importa.
Na realidade, meus amigos, isso é um desabafo. Acho inadmissível aquele pária que passa ao seu lado, com o mesmo uniforme, vivendo as mesmas agruras do mesmo emprego e não te cumprimenta porque pode cair um dente, talvez. Aquela pessoa que passa perto de um porteiro de prédio que lhe abre a porta do elevador e não agradece, nem olha na cara do sujeito que faz o seu trabalho, é uma idiota. O sujeito que faz uma obra qualquer e simplesmente a considera como o suprassumo de qualquer coisa e não vê o que o seu semelhante faz, é um alienado. O gari é o responsável pela cidade ser limpa e saudável – é nosso amigo sem nos conhecer.
Estamos no mundo para crescer juntos. Todos nós dependemos de todos os outros seres humanos desse planeta e de todas as profissões que existem. Somente quando houver esse respeito e essa admiração mútua estaremos bem. Enquanto o EU for maior que o NÓS, o mundo será essa disputa de egos e poderes fazendo com que matemos todos ELES, para que sobrem somente EU – eusozinhomesmo, eumebastomesmo, eusoueu, eu sou foda!
Pensem bem antes de se enclausurarem em uma imagem que, às vezes, não é nem admirada. Podem estar girando ao seu redor por interesse ou por uma necessidade extrema. Muitas vezes, quem está ao redor, girando, girando, está armado até os dentes para, ao menor deslize, na mínima oportunidade, ver o seu sangue e ocupar o seu lugar.
Vamos trocar o eu pelo nós e, em um grande abraço, vamos procurar crescer juntos, elogiar o próximo, olhar para quem está ao lado, abaixo ou acima, vamos sorrir para quem passa por nós – com certeza receberemos um sorriso também.

         

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Artur Laizo Escritor

Artur Laizo nasceu em 1960, em Conselheiro Lafaiete – MG, vive em Juiz de Fora há quatro décadas, onde também é médico cirurgião e professor. É membro da Academia Juiz-forana de Letras e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete, Sociedade Brasileira de Poetas Aldravistas e presidente da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora - LEIAJF.

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