ASSASSINATO NO CONGRESSO MÉDICO – Pão de Canela e Prosa
Pão de Canela e Prosa

ASSASSINATO NO CONGRESSO MÉDICO

Capítulo 1

A cidade estava preparada para um grande congresso de Medicina Intensiva. Esperava-se em torno de cinco mil participantes entre médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas que trabalhavam com CTI. Era um congresso esperado por todos que se realizava de dois em dois anos sempre em uma capital brasileira. Os hotéis estavam lotados e o trânsito virou uma loucura muito maior do que já era. Outdoors por todo lado davam as boas-vindas aos congressistas.
O Dr. Marco Antônio de Souza, respeitadíssimo no meio médico com várias publicações científicas chegou a Belo Horizonte dois dias antes do início do congresso. Trouxe a esposa, Luciana, que, apesar de não ser médica, o acompanhava em todas as suas viagens.
O casal se hospedou em um grande hotel da Avenida Afonso Pena e dali programaram visitar alguns parentes e amigos e era também um ponto estratégico para que o médico pudesse participar de todas as sessões que queria, em várias das quais seria debatedor, mediador ou apresentador de novos trabalhos.
A ideia de vir antes do início do congresso para a cidade era justamente para ficar com a esposa esses dias e depois enfurnar-se nos afazeres do congresso.
Na noite de terça-feira anterior ao início das atividades, encontraram-se com amigos e foram para um restaurante de comida mineira “Casa dos Contos” na Rua Rio Grande do Norte.
A mesa de oito lugares foi ocupada por quatro casais de amigos do dr. Marco Antônio. Estavam próximos a ele o dr. Geraldo Pimentel e esposa, Cibele, logo após o dr. Cláudio Freitas e a dra. Maria Augusta, perto de Luciana estavam o Dr. João César e esposa Avelina.
Eram amigos de muitos anos, mas praticamente só se encontravam em congressos de Medicina Intensiva.
A noite foi muito agradável e todos comeram muito bem. Dr. Marco Antônio bebeu um pouco mais de cerveja, não estava acostumado a beber já que sua vida era a Medicina em primeiro lugar e depois, bem depois, o resto, inclusive a esposa e os dois filhos. Ele estava feliz de rever os amigos, de estar em evidência naquele congresso tão grande – seria o primeiro congresso presencial depois da pandemia -, quatro anos sem encontrar os amigos e debater e conversar e falar de Medicina intensiva.
Chegaram no hotel e o casal estava muito contente. Apesar da dedicação exclusiva à Medicina, Marco Antônio amava a sua esposa e ela compreendia e aceitava o marido como ele era. Ela cuidava da sua vida como uma boa esposa e sempre admirou o sacerdócio do marido. Os filhos nasceram e cresceram sem o pai, mas ela justificava sempre a sua ausência e seu excesso de trabalho. Os filhos foram criados para amarem o pai, mesmo ausente. O casal somente estava inteiramente unido nesses momentos de viagens – sempre com alguma razão científica -, mas vivia muito bem.
Enfim o Congresso começou. Primeiro dia, credenciamento, rever amigos distantes e um jantar fenomenal para quem quis aderir ao evento e pagar o preço extra do jantar. Claro que o dr. Marco Antônio e esposa foram ao jantar. Ele não perderia esse momento em que poderia aparecer e falar de si mesmo. Esse era um grande problema, quase doentio do médico: falar do que fazia e achar que somente onde ele punha suas mãos era bem-feito. O resto do mundo em sua concepção era coadjuvante de seu brilhantismo.
Ele bebeu novamente um pouco a mais do que conseguiria e ficou muito alegre e comunicativo. Voltou para o hotel e, na euforia, fez amor com a esposa e apagou imediatamente, como sempre fazia.
No dia seguinte, tomou o café da manhã com Luciana e se despediu da esposa. Ele tinha um dia cheio e ela iria passear por Belo Horizonte e rever algumas amigas.
Ele saiu extremamente excitado com a perspectiva de ser o principal foco de atenção no maior congresso de Medicina Intensiva da América Latina.
Durante o dia todo ele não parou um minuto. Mudava de salas a cada sessão e todo mundo do congresso o viu. Quem o conhecia, sabia quem ele era e o admirava, quem nunca o havia visto, ansiava por conhecê-lo. Ele estava se sentindo, como sempre, a maior estrela do universo.
Tarde da noite, entrou no carro do dr. Jerônimo que estava hospedado no mesmo hotel e seguiu para encontrar a amada esposa.
Ainda discutiu alguns pontos de Ventilação Mecânica na Síndrome Respiratória da Covid com o colega e subiu para o quarto. Estranhou que na porta estava pendurado na maçaneta o aviso do hotel para não perturbar o hóspede – sua mulher jamais faria aquilo. Usou o seu cartão para abrir a porta e entrou no imenso quarto que havia reservado para o casal. Na antessala não observou nada de anormal, mas ao entrar no quarto, soltou um grito de pavor.
Sobre a cama de lençóis extremamente brancos, estava o corpo de sua esposa com a garganta cortada tingindo tudo de sangue. Ele ainda tentou ver se ela estava viva, mas era muito tarde. O corpo já esfriava sobre a cama.
O médico desesperado ligou para a portaria e gritou ao telefone:
_ Socorro! Mataram a minha mulher! Socorro.
Ele largou o telefone fora do gancho e sentou-se na poltrona perto da cama aos prantos.
Continua…

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Artur Laizo Escritor

Artur Laizo nasceu em 1960, em Conselheiro Lafaiete – MG, vive em Juiz de Fora há quatro décadas, onde também é médico cirurgião e professor. É membro da Academia Juiz-forana de Letras e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafaiete, Sociedade Brasileira de Poetas Aldravistas e presidente da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora - LEIAJF.

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